Este artigo é sobre uma cerimónia que foi recentemente inventada (nem 15 anos terá sequer) decorrente de um erro grave e doloso: que o caloiro não pode trajar.
Fique claro: o caloiro pode trajar, logo que se matricule no Ensino Superior. Qualquer determinação em contrário atenta à Tradição (que está acima de "tradições de 3/4 de mês").
As provas cabais e documentais sobre isso, podem ser AQUI encontradas.
Eu próprio fui assim doutrinado no passado (que os caloiros não trajavam). Mas o simples facto de ouvir quem disesse que tal não tinha razão de ser, que Coimbra (Alma Mater) nunca tal impusera (porque nunca fora tradição ou regra) levou-me desde cedo a colocar em causa as doutrinas avulsas e procurar apurar as coisas.
Se no passado não havia o acesso facilitado à informação, hoje parece-me não haver desculpa, embora saibamos que os meios informáticos também ajudaram a que mitos e erros fossem mais amplamente divulgados.
Nunca percebi essa fixação do traçar a capa. Aceito que alguns queiram valorizar o momento em que um caloiro traja pela primeira vez, mas haja inteligência para não ir além disso.
O baptismo/imposição da capa é bonito, é simbólico, o padrinho impõe a capa simbolicamente........ tudo muito certo e nada a obstar e é precisamente essa a origem desta cerimónia: a imposição das capas (e não o traçar das mesmas) .
O problema é quando se ouve, em mais do que uma academia (é passar, por exemplo, os olhos em alguns fóruns) o seguinte (e similares):
- "Só podes começar a traçar a capa a partir da segunda matrícula"
- "Não podes traçar a capa enquanto alguém não ta traçar na cerimónia"
Não há outro modo de o dizer: é de uma estupidez que nos leva a perguntar como é que esta gente anda no ensino superior.
Qualquer dia arranjam algo para o nº de furos do cinto das calças ou para o apertar do fecho da saia, ou ainda paa a colocação do primeiro emblema ou do primeiro pin. Haja pachorra!
As cerimónias ditas do "traçar da capa" são invenções recentes que, na sua quase maioria, nem existiam há 15 anos e que são uma deturpação daquilo queb originalmente se pretendia evocar: a imposição e baptismo da capa (mesmo que já tivesse sido usada).
Foram uma invenção criada para assinalar e festejar o facto de muitos caloiros trajarem pela 1ª vez na sua 1ª serenata da Queima (motivado pela estupidez de dizer-se que os caloiros não trajam).
Em rigor, no início (e vejam como rapidamente dão cabo das coisas) estes eventos nem sequer eram para "traçar as capas", mas sim para as benzer, seguindo-se depois a sua imposição pelo padrinho/madrinha.
Com efeito, tal tradição da bênção das capas, já vem de longe. Em Coimbra, conforme nos relata António Nunes, [Havia a tradição dos padrinhos dos caloiros lhes "baptizarem" a capa e o gorro, atirando-os ao chão, pisando-os e salpicando-os com gotas de vinho, costume que ainda se praticava na década de 1980] in Identidade(s) e moda, Percursos contemporâneos da capa e batina e da sinsígnias dos conimbricenses. Bubok, 2013, p.73, nota n.º 237.
Por se tratar de um momento solene, a capa era colocada descaída e nunca traçada.
O traçar, esse, ocorria já só no local da Serenata. Aí sim, se preciso fosse, e porque o caloiro muitas vezes ainda não dominava o gesto técnico de traçar a capa, era ajudado. Mas era judado pelos colegas e não necessariamente pelo padrinho ou madrinha.
Em casas onde permitem (e bem) aos caloiros trajar, vêm depois com a palermice de os proibir de traçarem a capa. Haja pachorra para tanta acefalia.
O traçar, em si, não tem significado rigorosamente nenhum. A imposição da capa ou o seu baptismo, aí sim, poderá reflectir algum simbolismo e solenidade.
Traça-se a capa como se abotoa um botão: quando dá jeito e é preciso, seja caloiro ou veterano, mas nunca numa cerimónia, onde a capa se usa descaída pelos ombros.
Ninguém dita quem pode, ou não, traçar a capa. Qualquer pesoa, seja caloiro ou veterano, traça quando bem lhe apetecer, para além da Serenata Monumental ou da Praxe em Trupe (excepto os tunos quando em serenata ou grupos de fado - e é opcional) .
Em mais nenhum momento é preciso traçar a capa , nem sequer para "praxar" (outro mito estúpido e sem fundamento histórico).
Pare-se lá, pois, de dar corda a mais um mito.
É disso que muitas vezes falo quando critico os códigos (os ditos "codigozecos") da quase maioria das casas: que estão cheios de "lixo", de coisas que não têm fundamento histórico, que são artificialismos, invenções e que, muitas vezes, colidem com a própria tradição (como sucede com o proibir de relógios de pulso ou de lavar a capa).
Estão tão cheios de picuinhices, de papismos e "paneleirices" que complicam o que em Praxe sempre se quis simples e sóbrio (ao contrário de lapelas à general, de mangas arregaçadas para não se ver o branco e outras palermices do género).
Entretanto, também referir que se há cerimónias muito engraçadas, feitas com seriedade (e apenas se condena aqui proibirem caloiros de trajar ou, então, de traçarem a sua capa - isso sim uma aberração), e que são importantes, outras há que merecem total repúdio, onde praxam os estudantes sem nenhum motivo, quando não tem nenhum sentido ou fundamento o gozo ao caloiro nessa altura:
Por hoje é tudo.
Num próximo artigo, trataremos de mais umas quantas aberrações e invenções palermoides.
Veremos a questão do estar em Praxe, de estudantes que são caloiros N vezes, de Comissões de Praxe, Inscrições na Praxe, Regime de Faltas, Ser Praxado para estar na Praxe ou usar Traje.
Como podem ver, são N conceitos estapafúrdios e sem nexo que merecerão esclarecimento.
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