sexta-feira, 25 de abril de 2014

Notas à Praxe (des)importada.

Um argumento muito recorrente nas novéis academias é: "Não temos de seguir à risca Coimbra, porque temos as nossas próprias baseadas na nossa história local".
 
Então reflitamos:
Coimbra serviu ou não de modelo, como Alma Mater, para as Tradições e a Praxe estudantis existentes?
Se serviu, em que medida se pode importar avulso?
Com que legitimidade?
Pede-se uma nota de 5 euros e mete-se lá mais um zero esperando que passe por uma nota de 50?
Quem querem enganar?
 
É a Tradição rodízio onde a pretexto de implementar tradições estudantis, se faz corte e costura seguindo modas em vez de, precisamente, seguir a Tradição?
Metem-se pinheiros no lugar de árvores de fruto e pretende-se que continua a ser um pomar?
Mas querem enganar quem?
 
Se as nóveis academias usam traje estudantil (capa e batina ou imitandoa mesma), usam e impõem insígnias como grelo e fitas, usam pasta, fazem Serenata Monumental, têm Cortejo da Queima, têm Latada e Baptismos de caloiros, Julgamentos, Apadrinhamentos, Missa de Benção das Pastas, Praxe e praxes, usam insígnias de praxe e pessoais, cartola e bengala nos finalistas, usam terminologia e hierarquia inspirada na Praxe coimbrã (caloiro,doutor, veterano, Dux....ou equiparado) ............ como negar que a sua legitimidade assenta precisamente nesse franshising?
Mas se é franshising, até ele tem regras.
O Mc Donald's de Odivelas pode usar o logo da Mercedes, vender cachorros e missangas e continuar a pretender ser o Mc Donald's, só porque vendem Happy Meal de cerveja?
 
 
Se não querem copiar, então não usem nem façam nada do que acima se menciona. Nem queima, nem insígnias, nem traje, nem coisa nenhuma. Façam outra coisa, mas nenhuma das acima mencionadas.
E não usem sequer o termo Praxe Académica, praxar, praxista ou Tradição Académica.
Não se é meio engenheiro, meio médico ou meio ateu.
 
 
Ah, falta essa coisa bizarra das "Tradições da terra".
Quando nos deparamos com tal justificativo/explicativo, redobra o ridículo onde mingua o senso.
Que tradições locais, autóctones, próprias e singulares existem em Viseu, Leiria, Faro, Covilhã, Viana ou Alguidares de Baixo que permitam deturpar a Tradição Académica Nacional e nela enxertar excentricidades folclóricas museológicas ou figuras históricas kitadas?
 
[Sim, tradição nacional, porque a Tradição e a Praxe são um património que embora tendo por berço Coimbra, se tornaram, desde finais do séc. XIX até aos anos 60 do séc. XX, cultura sem fronteiras distritais, concelheias ou de freguesia.]
 
Que tradições estudantis locais foram desenterradas para permitir e legitimar que, por cima da importação ,se proceda ao desmebramento e desvirtuamento da Tradição?
Em que é que se arrogam as nóveis academias para justificar tão significativas diferenças e desvios, a ponto de delapidarem a Tradição que importaram?
Pois. É que se inteligência houvesse para, pelo menos, procurar essas anteriores tradições académicas, iriam, pasme-se, encontrar uma riquíssima tradição académica com sede nos liceus.
E de onde veio essa tradição académica liceal?
De Coimbra, pois claro. Uma tradição que não passava por importar tudo, diga-se. Mas aquilo que se trazia "ad intra" era respeitado e honrado tal qual, merecendo o respeitoe carinho "ad extra".
Mas havia espaço a actividades próprias? Havia, mas sempre com base na observânciae respeito pela Tradição, começando no traje nacional (capa e batina), passando pelos ritos de recepção aos novos alunos e terminando nos bailes de gala, récitas e cortejos de fim de ano (para só citar alguns acasos).
Pois é. É que se querem falar de tradições estudantis locais, elas existem, e apontam exclusivamente para os liceus.
Mas alguém se lembrou de tal? Se se lembrou, cedo preferiu esquecer (para melhor inventar o seu umbigo), até porque para os alfaiates estilitas e modistas de ocasião, era incómoda essa tradição do uso do traje nacional no liceu local ,ao longo de décadas.
 
A Praxe e a Tradição sofrem de processos de continuidade e ruptura. O que não podem é romper com a própria Tradição, com o que é basilar, querendo artificialmente implementar algo de novo, mas vestindo e aparentando velho (para conferir "pedigree de inglês ver").
Tanto esforço por ficcionar e inventar que podia ser aproveitado para conhecer, questionar e ponderar.
 
Tradição e Praxe há só uma, precisamente aquela que foi transversal de norte a sul do país e ilhas, desde finais do séc. XIX até ao luto académico de 1969.

Não se percebe é como, depois, se ignorou isso (ou até se percebe), deixando que se instalasse uma verdadeira e medieva idade de trevas no que concerne estas matérias.

Podem existir pequenas cambiantes, pequenas adaptações, espaço para a identidade própria, sem que isso signifique sacrificar o próprio conceito de Tradição e vergá-lo à mediocridade de quem faz da ignorância o seu cartão de visita e pede que todos lhe passem procuração para livremente codificar palermices (que depois todos seguem em fundamentalista manada).
 
Não tem de ser "igualzinho" a Coimbra, têm é de ser Tradição Académica, aquilo que lhe confere precisamente esse statvs qvo, ou seja, o que é essência e cerne, algo que para ser Tradição transporta um conjunto de usos e costumes anteriores aos adornos, aos enfeites, ao embrulho.

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