segunda-feira, 24 de abril de 2017

Notas sobre O Grito Académico "F.R.A."

Merece alguma atenção este assunto, porque me parece haver alguma falta de conhecimento sobre a forma e razão de ser deste tipo de interpelação e expressão efusiva de alegria e comemoração.
 

Para além disso, já não é a primeira vez que, no  mail do N&M, caem pedidos de esclarecimento sobre este assunto e, por esse mesmo motivo, decidi escrever alguns considerandos.
O Grito Académico divulga-se ao mundo tunante e académico nacional, com o lançamento do CD "Estudantina Passa", mesmo se, já antes, era de uso comum, com especial incidência em Coimbra  Porto.
 Não possuo qualquer dado documental e fidedigno que aponte a data da sua criação, até porque, como sabéis, o grito foi sofrendo alterações sucessivas ao longo dos tempos (nomeadamente nestes últimos 20 anos).
 O Grito Académico, comunemente usado, divide-se em 2 partes, a saber:  Dedicatória e Aclamação (em que existe uma voz de "comando" a que responde a assembleia). Assim, temos:
 
- Então (malta), e para............não vai nada, nada, nada, nada?
- Tudo !
- Mas mesmo nada, nada, nada, nada?
- Tudo!
- Então, com toda a cagança, com toda a pujança ..........(e outros dizeres)..... aqui vai/sai um...F-R-A!
 - Frá!
- FRE!
-Fré!
-FRI!
- Fri!
- FRO!
- Fró!
- FRU (com prolongamento do som É da letra  F: "éf "- concluindo com RU - "ériu").
- Fru!
 -(todos) FRA, FRE, FRI, FRO FRU
ALIQUA, (a)liquá, (a)liquá (BIS)
CHIRIBIRIBI-TÁ-TÁ-TÁ-TÁ (BIS)
HURRA, HURRA, HURRA!!!
 
 
Alguns irão torcer o nariz, porque o interpretam de outra forma, nomeadamente a parte do Aliqua ou do chiribiribi, mas mais à frente se explica.
 Obviamente que não podemos esquecer que, deste grito, também conhecemos a parte do "Aos canhões, a rolar peças!" ou ainda do "Ginga Baleia" (muito na moda no Porto, diga-se), tão bem reproduzido no grito que a E.U.C. eternizou no seu 1º CD (já acima mencionado).
 Mas, qual o significado deste grito, de onde provém e qual a sua razão de ser?
 
 

F.R.A. ("éfférreá")
 
A sigla F.R.A., e o actual grito, parecem provir dos tempos conturbados da Crise Académica (Frente Revolucionária Académica ou Falange de Renovação Académica), inspirados, no FRA brasileiro (Frente Republicana Académica) que alguns estudantes cariocas, em finais do séc. XIX terão criado - grito esse que voltaria a fazer-se ouvir em Coimbra, pelos refugiados estudantes brasileiros, albergados na República dos Cágados.

Estes estudantes recriam a Frente Republicana Académica de outrora, sob a batuta de um tal Divaldo Freitas (grande divulgador do grito) gritando "FRA!", como acrónimo codificado, contra o regime de Getúlio Vargas (1883-1954), o qual chegara à presidência da república brasileira em 1934, instaurando uma ditadura com o  golpe de Novembro de 1937.
Divaldo Freitas (que já entoaria essa sigla nos jogos de futebol do Cantanhede, segundo o avançado por Octávio Sérgio) passará esse grito para os quintanistas de medicina que, em 1938, o estreiam no jardim botânico da UC, rapidamente passando a todos os cursos que, nessa queima, o cristalizam e oficializam.
 
O grito passa, então,  para diversos contextos, nomeadamente o do futebol, ouvindo-se nas partidas da "Briosa", como forma de incentivar, exteriorizar, expressar alegria ou, como no caso da crise de 1968, como lema reivindicativo e contestatário.
 
Parece provável, contudo, a ligação à ideia revolucionária até porque quando referia a parte do "Aos canhões; a rolar peças" (popularizado pela EUC), está presente esta ideia bélica que, ao que tudo aponta, se referiria ao famoso Batalhão Académico de 1808, num exercício de saudosismo histórico da participação e garra dos Estudantes de Coimbra na luta contra os exércitros napoleónicos (1ª invasão). Deste modo, tudo indica ter origem no espírito "revolucionário" que grassou em finais da década de 60 do século passado.

O jogo de vogais AEIOU poderá ser influência de um tema brasileiro conhecido.

No Porto, segundo Eduardo Coelho, o Orfeão Universitário utiliza  AEIOU Ypsilon (que provém desse famoso tema de Vera Cruz), sendo o final do «grito orfeónico», que começa por «Arri-barri-barri-bá - Bá!», etc. até «Urri-burri-burri-bu - Bu!» (em uníssono). Ao que parece, é uma forma que só o OUP utiliza.
 
Ainda uma achega sobre a forma como alguns prolongam as vogais, mais parecendo, como diz o amigo Hugo, no Blogue Tesoural Tertúlia, citando o Dr. Octávio Abrunhosa : "...parecem ovelhas a balir! (calma, calma! Ainda há-de chegar o tempo em que gritarão “I-Ó, I-Ó”)".
 
Aliqua Vs Arriquá
 

Já no que respeita ao ALIQUA, dizer que o termo original, que é um pronome indefinido, é ALIQUIS (alguém, algo, algum), embora possa assumir-se como substantivo (aliquis, aliqua, aliquid – algum, alguma, alguém, algo, alguma coisa) ou, ainda, como adjectivo (aliqui, aliqua, aliquod – algum, alguma, algo).
 
É declinado como QUIS, mas com a adição do prefixo ali-: aliquis, aliqua, aliquod, com a única diferença que, no feminino, ele faz aliqua, e não *aliquae".
 
Pessoalmente, vejo isso como uma interpelação (recurso estilístico conhecido por Apóstrofe ou invocação), na ideia de arregimentar, chamar, congregar, reunir a atenção e vontades de todos e, por isso mesmo, a que está correcta.
 

Poderá também provir do termo Aléguá, que significa radioso (ou emite raios/que brilha), expressando alegria ("Aléguá, guá, guá"), um grito já em voga, ao que parece, nas claques brasileiras do início do séc. XX, numa corruptela de "Allez! Go! Hack!" (que Olavo Paes de Barros teria entoado no estádio do São Paulo, misturando termos de vários idiomas, após um temporal ter interrompido os treinos da equipa, incentivando os jogadores).
 
Sobre a possibilidade do "Aléguá", deixamos ao leitor a seguinte transcrição:
 
"Esquecidos os vivas “à Revolução Social” e “à inconsolável viúva do padre António Vieira”, lançados e popularizados pelo Pad-Zé, sem dúvida que só o F-r-á conquistou direitos de cidade entre a Malta coimbrã.
Não será curioso, então, fixar o momento em que tal brado se radicou na Academia de Coimbra? Cremos que sim e, por isso, redigimos este apontamento.
Quando – ainda não era, sequer, morrão de candeia – comecei a assistir a desafios de futebol, ouvi, uma e muitas vezes o Ribeirinho ( capitão de equipa ), tenente dos artilheiros…capitão dos carvoeiros, lançar o clássico “hip-hurrah”.
Por essa mesma altura lembro-me de ter ouvido um outro grito que creio ter tido apenas uma vida episódica e de que recordo só a parte final: - “Carvão, meninas…”.
O “ hip-hurrah “ era, entretanto, de uso generalizado e só os rapazes da República dos Grilos utilizavam a voz do seu insecto totémico para grilarem o seu “ cri-cri, cri-cri e os bichos o erudito “ Hic, haec, hoc “ ou o “ Qui, quae, quod “.
Outros brados tiveram memória transitória ; “ala-ala-arriba”, “ Cow-boy… tau-tau-tau… Allô, sheriff “ e o do “ …pico-pico… meia-hora “ mas, como inicialmente observámos, só o “ F-r-à “ se radicou fortemente e foi alastrando de um curso para a Academia, começando a ser o brado distintivo dos desportistas académicos e dos elementos dos organismos culturais da Academia – e com eles se faz ouvir de Norte a Sul de Portugal, nos relvados, nos rinques, nas piscinas, nos teatros, nos salões de recepção e nas ruas.
 Vejamos, então, a sua origem:
 Foi em 1937 que um grupo de estudantes brasileiros estagiou em Coimbra, tendo ficado instalados nas Repúblicas então existentes. Foram, precisamente, estes rapazes que trouxeram para Coimbra o F-r-à, que, aliás, como toda a semente de planta que se preza, levou algum tempo a germinar – um ano, exactamente – mas depois se enraizou como sabemos…
Recordada a sementeira, vejamos como se deu a eclosão da planta e o jardineiro a quem se deve a obra.
 Na Queima das Fitas de 1938 os festivais realizaram-se no Jardim Botânico. Numa das noites juntou-se um grupo bastante grande que resolveu fazer pé de vento. Propostas, apreciadas e recusadas várias sugestões, fixámo-nos em duas que recolheram a unanimidade dos sufrágios: o irmos cantar às meninas uma parte de uma canção que começava pelo verso “Deixa essa triste cara…” e lançar como brado o F-r-à. O que é certo é que foi o Divaldo, que acompanhara os seus compatriotas no ano anterior e que aprendera ( e ainda bem que recordou ) o Frá, fré, fri, fró, fru ,que deu a primeira sugestão e dito e feito, após meia dúzia de ensaios iniciou-se a digressão de todos os quintanistas de Medicina presentes que formaram um cordão que cercou as moças consideradas jeitosas e… e despejaram a cantilena.
 No dia seguinte (27 de Maio) quando chegámos ao festival, à futrica, encontrámos muitos grupos, grandes e pequenos, de académicos, fitados, grelados e sem insígnias, que cantavam por todos os cantos o “ Deixa essa triste cara, em que ninguém repara…” e por todos os cantos bradava “ F-r-á, frá; f-r-é, fré;…”.
A sorte estava lançada…
 …E quanto ao “F-r-á” não se pode dizer que a sorte lhe tenha sido madrasta.

 VERSÃO ORIGINAL:
“ F-r-á… frá ; f-r-é… fré… ; f-r-i… fri ; f-r-ó… fró ; f-r-u… fru ;
“ Alêguá guá-guá ; alêguá guá-guá ; chi ri bi bi tá-tá tá-tá ; hurrá , hurrá !”
 
(Fonte: Mário Temido in “Rua Larga. Revista dos Estudantes de Coimbra")
 
 
Uma outra tese aponta para a eventual proveniência  num suposto grito crioulo, também provindo do Brasil, que se pronunciaria como "aléquá, aléquá!". A pesquisa feita ao dicionário de crioulo diosponível na Net não contempla, contudo, tal, pelo que a corruptela para "aliqua" se avera algo improvável.
 Muitos pronunciam "ARRIQUÁ", mas é erróneo, pelo já explicado. Esta expressão, de que não consigo vislumbrar significância, poderá ter surgido por um facilitismo fonético (é mais fácil de pronunciar velozmente e é mais marcado e sonante) ou por influência do grito do Orfeão do Porto que, ao invés disso, pronuncia "Arribá" (de Arriba - acima/para cima), mas, seja como for, o "arriquá" é um erro.
 
CHIRIBIRIBI-TA-TA-TA-TA
 
Já o "CHIRIBIRIBI-TA-TA-TA-TA" é, ao que tudo indica, referente a uma Marcha Carnavalesca de Victor 34.115B, interpretada pelo "Bando da Lua", gravada em novembro de 1936 e lançada em dezembro de 1936.
 Recordo que, em inícios do séc. XX, as festividades estudantis, nomeadamente os cortejos, eram conhecidos por "Carnavais de Estudantes" (ou termo similar), sendo, pois, lógico que conste do grito uma referência histórica a esse facto e que, no fundo, traduz o espírito de folia, alegria e festa.
O "Foguete" (Final)
 
Por fim, a questão do FOGUETE (Chhhhhhh....Pum/....) e dos ditos que se lhe seguem (cada qual à sua maneira e tradição) é um a introdução muito recente. O meu amigo Eduardo Coelho, "Conquistador", diz-me que na 1ª vaga de Tunas do Porto não exisitia sequer.
 
Apenas condenar os que "inventaram" o palavrão final, tal como todos os acéfalos que o reproduziram. Estudantes do Ensino Superior deveriam destacar-se, também, pela eloquência e excelência, pelo menos em público.
 No Porto, segundo Eduardo Coelho, o «foguete» sempre se usou - o que é recente é o «té-ré-ré-ré-ré» (3x) seguido de «F...-se!», que é uma invenção pós-82... e que algumas tunas «de faculdade» usarão, por influência das respectivas «praxes».

Em Suma:
 
Uma coisa é certa: não há certezas, contudo julgo que esta explicação me parece a mais provável e verossímil (ou, pelo menos, há o cuidado de argumentar nesse sentido).
É óbvio que há coisas, nisto de gritos e afins, que podem nem sequer terem sido criadas com ideia de terem sentido ou explicação, mas terem saído assim só por acaso (mesmo se acredito pouco em acasos, neste particular).
Importa, julgo eu, que as pessoas reflictam sobre isto e sobre aquilo que gritam de peito cheio, de maneira a saberem o que dizem e por que o dizem (e o cuidado em, neste aspecto, fazê-lo "secundum praxis").
Não deixa de ser curioso que parte substancial do grito seja uma importação (3 aspectos do mesmo provêm do Brasil), o que não nos menoriza, antes mostra a riqueza da nossa diáspora.
 Se virmos bem, também os emblemas que se colocam nas capas são uma importação das Tunas Espanholas, inspiradas, por sua vez, na "Moda Mochilera" dos anos 60.
Haja o cuidado, inteligência e sobriedade intelectual, isso sim, de perceber por que se faz e as origens desse fazer.
Dizia o meu amigo, e ilustre, Eduardo Coelho, que "mais grave do que a censura do Estado Novo é a actual "Censura da Ignorância".
 
 
Sábias palavras!!!







 

Notas ao Código de Praxe da UALG


Mais um código sob análise, relevando-se  os seus erros mais crassos e graves.
Pode ser consultado AQUI 

Analisemos, pois, os artigos a merecerem reparo:

Art.º 1º

Diz que a Praxe Académica é, e passo a  citar: "...costume de cariz tradicional  praticado com vista à recepção dos novos alunos.". É tanto inexplicável como lamentável que nem sequer um documento deste tipo enuncie  e clarifique algo básico como é a diferença  entre praxes e Praxe.

Art.º 2º

Define os objectivos da Praxe, na base do  acima enunciado, pelo que temos erro  seguido de erro.

Art.º 3º

Define quem está vinculado à Praxe,  caindo no equívoco de dizer que todos estão vinculados,  mesmo que não se tenham manifestado nesse sentido.

Art.º 5º

Contempla como hierarquia o grau de  "Académico", esquecendo que académico é  qualquer estudante, desde o 1º ano da primária ao doutoramento, tanto professor como aluno. Académico é tudo o  que tenha a ver com estudos. Assim, todos são académicos e não apenas alguns.

Art.º 6º 

Define os locais onde não se faz praxe,  justificando que os locais de culto estão  isentos porque, pasme-se "...divino é  sagrado". Uma redundância que ignora que essa protecção em “solo sagrado” advém dos tempos em que existia,  na lei, o denominado "Asilo" (que Quasimodo reclama para Esmeralda, quando se refugia na Catedral de Notre-Dame, na famosa obra de Victor Hugo).

Art.º 7º

Define o que é o Espírito Académico. É  obra (e de uma enorme presunção, diga-se), ou seja, quem não sentir exactamente como definido no código, não tem Espírito Académico.

Art.º 9º

Define, como "Símbolos de Praxe", a  tesoura, colher de pau e, até o traje  académico, pasme-se!
Alguém esclarece os autores do código  que a colher, tesoura...são insígnias e não  símbolos? Alguém elucida os autores do texto que um traje não é um símbolo de Praxe, mas um uniforme identificativo do foro académico (do estudante)?

 Art.º 11º e 12º

Define o que é um anti-praxe e quais as  consequências desse "estatuto", num enorme mal-entendido e profundo desconhecimento da res praxis.  
Não é anti-Praxe quem se recusa a ser  praxado, que fique claro!
Está na Praxe quem quer e quando quer. Adere quando bem quiser, qualquer estudante. Para se estar na Praxe  basta que, para cada acto e momento, se  cumpra o estipulado. A Praxe não é feudo ou burgo de alguns. Cabe aos responsáveis pela Praxe, zelarem pelo cumprimento das regras, informar e formar, mas não excluir ou criar portagens.

O acto de praxar caloiros não depende de ter sido praxado. Ter sido praxado nem  sequer é garante de aprender coisa nenhuma de Praxe ou de como se praxa (praxes não são recruta). Não se caçam moscas com vinagre e, para bem integrar, não é com N artigos que têm mais de coacção e restrição do que de explicação e integração.

Chega este artigo, na sua alínea C, a dizer que um “anti-Praxe” perde o direito a trajar. Isso é o cúmulo;não faz sentido, nem se baseia em Tradição ou precedente algum, desculpem que vos diga! O Traje identifica o estudante e não o praxista !!!  Estranhamente, o regulamento do traje a que tivemos acesos nada diz sobre isso. Recordemos, igualmente, que se um traje é proibido a um suposto "anti-praxe", deixa de ser um traje académico (leiam AQUI)

Na alínea D, chegam a dizer que um anti-praxe não pode ir a jantares de  curso, como se jantares de curso fossem da Praxe (e não são). Mas quem foi o ignaro que  inventou isto? Haja um pouco de bom-senso, que diabo!

Art.º 16º

Define os deveres da "Besta" (mais uma expressão que seria escusada, porque   "Besta" não é grau hierárquico ou estatuto, mas apenas adjectivo que, por brincadeira, se dá ao caloiro).

De notar que erradamente, a nosso ver, criaram 2 hierarquias antes de Caloiro, o que não se percebe, porque a Tradição consagrou que um novato que se matricula pela 1ª vez no Ensino Superior se designa de “Caloiro”.  Mais um papismo que não traz nada de útil, quando a Praxe ser quer pragmática.

Mas este artigo enuncia autênticas heresias, totalmente inadmissíveis,  que chegam a  ser uma vergonha para a Praxe, como, e passo a elencar:
"...a  besta tem de ser servil, obediente e  resignada; não pode ter opinião; não pode rir, olhar nos olhos, não pode fumar, deve manter-se  sempre num plano inferior aos praxantes; deve respeitar os praxantes até na linguagem  corporal (???); não pode reclamar" e, entre outras  determinações estapafúrdias,  a ALÍNEA W diz que a "besta aproveita a sua  ignorância para procurar conhecimento" (onde me parece claro que este artigo se refere afinal, aos autores deste código!!!!).

É muito grave, meus caros, que este conjunto de ditames acabem por subsidiar  a promoção de abusos e de ver esses abusos “protegidos por lei”. Por outro lado, este “código” nada refere quanto a proteger os caloiros de abusos e nada quanto a penalizar quem os comete. Em lado algum se define o que é lícito, o que é admissível nas praxes e aquilo que atenta à lei. Assim, entende-se que violar a integridade física e moral do indivíduo, coagi-lo…. é algo lícito e uma filosofia inerente ao espírito do código e de quem aceita tal. Não podemos acreditar que os estudantes da UALG se revejam nessa doutrina que "permite" essa forma de olhar e tratar colegas.

Art.º 19º

Um artigo referente ao traje, mas nada diz sobre o mesmo; nem como é composto, nem como se usa.....nada! Poderíamos igualmente colocar reservas a certas explicações de indóle etnográfica, que "justificam" certas peças, mas este não é o cerne desta análise.
Refere haver um regulamento do Traje (que analisamos no fim), esquecendo que, a haver documento que formaliza e define o seu uso e constituição, esse documento é o Código.
Termina dizendo que o traje só é permitido a quem conhecer integralmente o regulamento do seu uso. E como fazem isso? Fazem oraisou testes escritos?
E o(s) autor(es) deste código prestaram alguma prova sobre conhecimento acerca de Praxe e Tradições Académicas? A julgar por este código.......hummmmm

Art.º 27º e 28º

Mais uma concepção equivocada entre "Veterano" e "Velha Guarda". Mais um papismo que confunde, complica e estratifica, sem benefício algum.

Art.º 31º

Define em que consiste a "execução da Praxe" (não se percebe esse “conceito”), dividindo-a, grosso modo, em época de recepção aos caloiros e Semana Académica.

Quanto aos ritos com caloiros:

- Alínea E: Fala em Missa do Caloiro para designar uma bênção Académica (alguém aqui não sabe a diferença entre ambos);
- Alínea F: Procissão das Velas (e, aqui, o autor do código, devia estar em Fátima e imaginou os peregrinos todos trajados e ele próprio transportado num andor);
- Alínea H: Alcoolização dos Perus("Peru" é um grau hierárquico, neste código). Mesmo que referente a uma prática muito usada pelo povo na matança dos perus, essa conotação não deixa de ser pejorativa à imagem do estudante (já demasiado degastada pela conotação alcoólica);

Depois termina mencionando que a Semana Académica, e note-se o requinte, "…tem como principal objectivo a comemoração da passagem de perus a caloiros, assim como assinalar o término das praxes.". Eu que pensava que a Queima/Semana Académica assinalava, usualmente, o fim das aulas e o momento de formatura dos finalistas !

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Um código algo mal amanhado, que não explica nem circunstancia; que é bastante incompleto (pouco ou nada sobre, por exemplo, a Semana Académica: imposição de insígnias, serenata, cortejo, missa de benção das pastas....) e que dá demasiada ênfase aos caloiros (hierarquia, deveres, restrições, disposições) e ritos com os mesmos (o código é quase só, todo, sobre isso).
Não se pode chamar a isto um Código de Praxe, mas de praxes (e mesmo assim, com as lacunas evidenciadas)!

Critica-se, pois, quem esteve por detrás da redacção deste código, e não os actuais alunos (note-se,) carecendo de pesquisa e conhecimento basilar sobre Tradição Académica e, a espaços, de falta de cuidado com regras básicas de civismo e respeito pela dignidade do indivíduo (Artº 16º).
  
Caberá aos actuais líderes, se assim considerarem e ponderarem com seriedade, rever alguns aspectos aqui criticados, procurando retirar do código tudo quanto não tem fundamentação, de facto e/ou reajustar alguns conceitos que subsidiam alguns artigos aqui questionados.
Os actuais códigos não podem ser produto de meia dúzia (cuja competência nestas matérias não é líquida nem clara), imposto a uma grande maioria que nem chamada a pronunciar-se é/foi sequer.

Um código que, mesmo não sendo, porventura, exequível ser referendado, deveria ter a possibilidade de, antes de aprovação, ser posto à consulta e debate públicos da academia em que se insere, para que todos nele se revejam e possam contribuir para o seu enriquecimento, nomeadamentre em matéria de respeito pelso direitos civis e pela dignidade da pessoa. 

Fica o reparo, na esperança que possa merecer a atenção devida, desde já disponibilizando-me para colaborar na prestação de esclarecimentos.

ADENDA:

------------------------------- Regulamento do Traje ------------------------------- 




Analisemos, agora o dito regulamento do Traje, disponível para consulta AQUI:

Art.º 4º (sobre os acessórios)

Estipula que não é permitido o uso de t-shirt por baixo da camisa, pois quem tiver frio que trace a capa. Não se percebe, de todo, tal, pois em momento algum se pode passar revista à roupa interior e muito menos legislar sobre a mesma. Só faltava mesmo (como existem casos noutras academias) legislarem sobre a cor da roupa interior, não?
Também não permitem o uso de telemóvel visível. Isso significa o quê? Que o estudante trajado não pode fazer uso dele? Já lá vai o tempo em que o telemóvel andava em bolsas que se punham ao cinto, mas hoje ele costumam andar no bolso, daí que este papismo não passa disso mesmo.

Art.º 5º

Diz, na sua alínea J, que os rapazes podem usar cabelo comprido, preferencialmente solto. Porquê solto? Questões de gosto do legislador não são argumento.

Art.º 6º

Diz que, no caso das raparigas, na alínea I, também o cabelo deve ser usado solto. Quer parecer-me que esse tipo de sugestão não tem, também sentido algum. A sobriedade tanto se alcança com ele solto como amarrado.

Art.º 7º

- Alínea A: diz que os alunos com mais de 1 matrícula não podem traçar a capa debaixo de tectos, salvo serenatas, actuações de Tuna ou membro de uma "lutraria". Querem explicar a razão de ser de tal?
Então se, como diz o Art.º 4º, não se pode usar nada por baixo da camisa, e em caso de frio intenso deve-se é traçar a capa, o estudante em causa que sinta frio, mesmo debaixo de tecto, não o pode fazer? Era bom decidirem-se!

. Alínea B: diz que a capa não se pode encontrar a mais de 5 metros do estudante. Qual a razão? Com que fundamento? É que uma coisa é ter de se estar trajado a rigor em actos e cerimónias da Praxe, outra é cair no ridículo das pessoas andarem de fita métrica a medir distâncias (podiam por um alarme, já agora). Mais um papismo.

- Alínea C - Diz que na capa, para além dos emblemas, se podem por insígnias pessoais. Então nela podem colocar-se fitas, grelo...? Essa é nova!

- Alínea D: afirma que a capa só se usa de 2 formas (e lá diz como). Mais um papismo.

- Alínea F: diz que o nº de emblemas na capa tem de ser ímpar. Mais um mito do ímpar que bem gostaria que me explicassem, porque de praxe nada tem. Sobre esse mito, aqui fica esclarecimento.

- Alínea O: diz que se traça a capa "em fados e serenatas". Então ouvindo-se um fado de Lisboa (seja gingão ou vadio), que nada tem a ver com estudantes, traça-se a capa? Há aqui alguém que tem uma noção não muito esclarecida sobre fado.


Art.º 8º (emblemas na capa)

Nada a dizer quanto este artigo a não ser dar os parabéns, porque respeita a origem e tradição, o espírito, da colocação de emblemas

Art.º 9º

Alínea C, diz que o coser os rasgões é facultativo, mas faz-se em "ponto cruz". Alguém explica ao legislador que ponto cruz não tem a ver com coser, mas com bordar?????? Santa ignorância!

Art.º 10º

Começar por parabenizar o facto de, neste regulamento, permitirem aos caloiros trajar desde a hora em que se matriculam. Não há muitos códigos que assim o deixem claro.
Contudo estragam o soneto ao dizerem que não podem traçar a capa. Podem então usar T-shirt ou camisola interior em caso de frio? E numa Serenata ou ouvindo "fados" (art.º 7, alínea O) também não podem?
Não tem sentido.
Que não possa ainda usar emblemas, pins, fazer rasgões.... agora traçar a capa é algo próprio ao seu uso. A capa serve para agasalhar, é essa a sua principal função. A Praxe quer-se pragmática e não papista e incoerente.


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Depois o regulamento do traje cai numa misturada sem nexo ao contemplar artigos relativos a trupes (a que chamam "Lutrarias") e seu funcionamento (coisa que é matéria de código e não de regulamento de traje).
Mas analisemos alguns itens sobre a matéria:

Art.º 19º

- Alínea A: diz que sapatos, cintos, meias e outos que sejam estranhos ao traje são confiscados e entregues á Associação Académica. Ora 2 erros patentes, um deles grave: confiscar algo que nem sequer é considerado como da Praxe, está fora da alçada da mesma. Deve-se repreender, mas confiscar é roubo e crime (anti-Praxe, portanto). Depois estipula entregar as peças confiscadas à Associação Académica. Mas, afinal, a Associação tem a ver o quê com Praxe? Há aqui misturas inusitadas.

- Alínea D: prevê que quem for encontrado a mais de 5 metros da capa é obrigado a traçá-la e assim permanecer durante 1 hora, independentemente das condições climatéricas. Isso constitui crime e uma real estupidez. É coacção física e isso nada tem de Praxe.

- Alínea E: consagra que faltas reiteradas, cumulativamente a uma capa deixada a mais de 15 metros leva imediatamente á confiscação do traje. Mas o traje é do dono ou de quem? Quem pagou o traje?
Mais uma vez, a apologia do crime através do roubo e coacção. Se o estudante se recusar fazem o quê, batem-lhe, retiram-lhe o traje por meios violentos?
Há aqui quem não tenha noção dos limites e da própria lei de um estado de direito, armando-se em inquisidor e polícia. Isso não é Praxe, meus caros, é ditadura acéfala no seu estado puro.
Essa das distâncias da capa só me leva a perguntar por que raio é que não é considerada insígnia de praxe uma fita métrica (com o mínimo de 15 metros)?

 Art.º 21º (Casos Omissos)

Diz que são resolvidos pela Associação Académica. Então o traje é da tutela de quem, da Praxe e seus organismos próprios, ou da Associação de estudantes?
E que poderes legais tem a dita associação para, em matéria de infracção do uso do traje, poder obrigar seja quem for às sanções acima referidas?
Claramente que estas regras sancionatórias foram urdidas sem pensar e sem noção da realidade e do civismo, e muito menos com cariz pedagógico, formativo ou integrador.


Concluindo: repensar e rever certos conceitos e normativos, por uma questão de coerência, de respeito pela Tradição e, até, da imagem da Praxe e estudante da UALG.

Notas ao Código de Praxe da FML

Código disponível AQUI



Nesta análise ao código da Praxe da Faculdade de Medicina de Lisboa, começar por elogiar um aspecto de pormaior importância:
Nos artigos 44º e 45º, sobre os direitos dos caloiros, é deixado bem claro, e muito bem, a defesa ds direito e dignidade dos novatos, declarando como infracção qualquer abuso  naspraxes que puserem em causa a integridade física, moral, religiosa, psicológica, financeira ou sexual da pessoa sobre quem é exercida.
Aplaude-se tal menção e o deixar claro, pois escapa a muitos “códigos”, definir o que é lícito e o que não é, dentro do âmbito das praxes, assim se promovendo o abuso e o desvirtuar do que é res praxis.
Pena, contudo, que se tenham esquecido de um outro pormaior de relevo: é que só adere à Praxe quem quer (e quando quer).


AGORA OS ERROS GROSSEIROS

Artº 2º

Vincula à Praxe todos os estudantes, não percebendo que cabe exclusivamente a cada estudante vincular-se livremente. É-se caloiro, independentemente de haver Praxe, independentemente de ser praxista ou não.
  
Artº 3º

Ainda admite as designações de "Doutor de Merda" e "Merda doutor", o que me parece desjustado, pois isso não tem já qualquer sentido nos tempos que correm. Essas designações não abonam em favor da imagem do estudante e deveriam ter sido abolidas há muito, am meu ver, desde logo em Coimbra.
Por mais antigas que essas expressões sejam, a ainda fazerem sentido para alguns, por um qualquer revivalismo histórico, seria tão só em Coimbra, mas não creio que tudo o que seja antigo tenha necessariamente de ser mantido só por esse facto. Tal como se aboliu o canelão e outras práticas tidas como desadequadas, também estas designações não me parecem pertinentes.

Também contém outro erro (por cópia do código do Porto, parece): ao considerar o "Dux Facultis", quando se escreveria "Dux FACULTATIS". Uma designação copiada do código do Porto (nada contra), e que resulta de um lapso dos colegas da Invicta , na altura, por falta de conhecimento das regras de latim.
  
Artº 4º

Define matrícula e sua "equivalência", quando a Praxe não tem autoridade para tal, coisa que apenas cabe à secretaria da instituição.

Artº 49º, sobre o Traje (Capa e Batina):


ALÍNEA A
- Ponto 10: determina nº ímpar para botões do traje que, como bem sabemos, é mito e ficção.
- Ponto 13: proíbe o uso de relógios, coisa que não tem sentido ou fundamento nenhum;
- Ponto 14: só autoriza Gorro "sob" a cabeça", quando deveria ser "sobre a cabeça". O gorro é peça a que tem direito qualquer estudante, seja caloiro ou não, pese embora ser mais usado por graça do qe outra coisa.


ALÍNEA D
- Proíbe que se vejam os punhos da camisa, quando, à noite, a capa está traçada, o que não não faz sentido nem encontra explicação na tradição;

ALÍNEA E
-Ponto 1: Diz que a capa "se poderá separar do corpo mais que sete passos", o que  tem razão de ser;
-Ponto 2: Diz que a capa se usa traçada no exercício da Praxe, o que é falso. Apenas se traça “obrigatoriamente” na Serenata e em Trupe, nada mais. Fora isso, traça-se quando bem nos apetece;
- Ponto 6: Define mal o conceito dos rasgões. Com efeito, só se fazem pequenos rasgões do lado oposto ao da colocação dos emblemas (cerca de 5cm, e feitos sem uso de nenhum objecto, mas com os dentes);
- Ponto 8: Determina mal o acto de coser os rasgões. Se quem fez os rasgões morre, não se cose rigorosamente nada (pelo menos não conheço regra que alguma vez falasse disso). Se há mudança do namorado ou namorada, o rasgão (feito a meio da capa, no tamanho máximo de 1 a 2 palmos) é usualmente cosido a branco e não da cor de curso, independentemente da proveniência do/a amado/a. Seja como for, coser os rasgões ou não é da vontade pessoal e não imposição tradicional;
- Ponto 10: Diz erradamente que não se pode lavar ou limpar a capa. Um erro muito grave;
- Ponto 11: Diz, e passo a citar, que "Quando um Doutor ou Veterano hierarquicamente superior estiver de capa traçada os restantes Doutores ou Veteranos hierarquicamente inferiores também têm de o fazer". Ora, em tempo algum alguém deve ser obrigado a traçar a capa só por um veterano com mais matrícula ter a sua assim. Não faz sentido. Só se traça em 3 ocasiões: Serenata, Trupe e quando quisermos.

ALÍNEA F
- Ponto 1: determina mal a colocação dos emblemas. Em momento algum é da Praxe colocar emblemas de onde nasceu o pai ou a mãe;
- Ponto 2: Determina nº ímpar para os emblemas na capa, o que não se compreende, pois o nº ímpar nada tem a ver com embemas na capa;

Artº 53º 

ALÍNEA A
- Determina um "Caralhinho" como insígniade Praxe, dizendo que tem de ser obrigatoriamente da Região Autónoma da Madeira (por haver existência de um protocolo entre a FML e a Uma). É algo sem nexo, a meu ver, não apenas o nome usado (palavrão não é de Praxe) e é escusado, mas no acto de inventarem insígnias que nenhuma relação evidente tem com Lisboa e a Faculdade de Medicina, e menos ainda com Praxe.

Artº 58º

Determina que nenhum caloiro pode assistir ao gozo de outro sem estar a ser igualmente gozado.
Um erro crasso, pois nenhum caloiro pode ser obrigado a aderir ou submeter-se às praxes.

Artº 100º

Não se deve escrever (nem dizer) "Decretum", mas "DECRETUS".

Artº 101º

Determina que os decretos sejam redigidos em latim macarrónico, mas julgo que deveriam evitar tal, pois não dominam as regras que presidem a tal linguagem. O melhor seria optarem por escrever em português corrente, com palavras ou expressões isoladas em latim macarrónico.

Artº 110º

Determina poder-se intimar pessoas a comparecer perante a Comissão de Praxe, Dux ou quejandos. É um enorme paradoxo tendo em conta os atigos 44º e 45º, ao considerar a possibilidade de coagir alguém a comparecer por razões de Praxe. Pedir, convocar, solicitar...agora intimar?

Artº 124º

Considera insígnia pessoal a CHUPETA, a CARTOLA, A BENGALA E O LAÇO OU ROSETA (mesmo que simbólicos), ora não são insígnias pessoais a Chupeta (não é sequer insígnia nenhuma de coisa nenhuma e de Praxe nenhuma) e a Cartola, bengala laço e roseta (laço e roseta são coisas distintas, já agora) não são bem insígnias, mas até concedendo que são identificativas do finalista, então designá-las especificamente, e à parte, como “Insígnias de Finalista” – as quais são de cariz e origem carnavalesca, fique claro.

Artº 131º

Define as fitas mas não o seu nº, quando a tradiçãomanda que sejam unicamente 8.
Numa cidade onde é moda usarem-se pastas cartonadas e brasonadas com milhares de fitas lá dentro…… era importante promover a defesa da tradição do uso da pasta fitada.

Artº 134º

Diz que os antigos estudantes ligados a grupos académicos da FML podem usar traje ou até só podem a capa (usarem só a capa é o que dita a Tradição, aliás), esquecendo que nenhum código, Dux ou quejandos pode pronunciar-se sobre pessoas que não estão na Praxe (na Praxe, e no âmbito do código, só podem estar alunos, e nunca antigos alunos). Os antigos alunos/estudantes só prestam contas aos organismos em que se inserem.

Artº 136º

Diz que, e passo a citar, "Para efeitos de PRAXE não há distinção entre estudantes ordinários e voluntários.", coisa que é algo confusa, pois à Praxe adere apenas quem quer.

Artº 140º

Diz que para se ter padrinho/madrinha é preciso que tal se faça por escrito e, ainda por cima, verificado pela comissão de praxe. Não faz sentido, nem tem precedente. Mais um papismo sem utilidade nenhuma. Doutores a fazerem-se rogados e caros, à espera de “graxa”?…..pode ser cómico se for informal, mas, como regra, não tem nem piada nem se vê nisso grande lógica.

Artº 153º

Diz que o Caloiro só pode usar traje a partir do "Traçar da Capa". Mais uma palermice pegada, numa determinação que foi copiada de algum lado e onde a ignorância passou a ser alvo preferencial do copy-paste. Um caloiro pode usar traje, desde que se matricula na instituição. Essa é a tradição. O resto é invenção que deturpa, descaracteriza e delapida.

Artº 158º

Diz que o caloiro só pode traçar a capa se for o padrinho/madrinha a fazê-lo primeiro, e se estiver também de capa traçada. Mais uma tonteria promovida pela ignorância e cópia sem critério.

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Erros que merecem reflexão, pois, em alguns casos, chega, até, a ser incoerente a sua ocorrência numa casa que se costuma distinguir, pela positiva, da larga maioria daquilo que existe em Lisboa.
Se tanta exigência é pedida na admissão em Medicina, e se reconhece a exigência do seu curso, por que razão são tão pouco rigorosos e exigentes na Praxe?
Porque conheço algo da realidade da FML, estou seguro que estas questões e reparos serão tidos em linha de conta.

Fica, para além da crítica,  a reiterada disponibilidade para esclarecer e ajudar.

Notas de Traje no Porto - do argumento igualizador.

Um artigo assaz interessante, datado de 1888, em plena época de mudança de paradigma do traje estudantil (com o abandono das vestes talares, de feição eclesiástica, para o modelo burguês, anti-clerical), onde a Academia do Porto (ainda sem Universidade - que só será criada em 1911) se une a pedir a obrigatoriedade do porte do traje nas suas escolas de instrução secundária e superior (o traje estudantil já estava em uso, mas sem a mesma obrigatoriedade que na Universidade).

Durante uma investigação feita ao acervo do Comércio do Porto (Arquivo Municipal de Gaia)encontrámos, pela 1ª vez, o argumento do traje como meio de esbater as diferenças sociais (não para explicar a sua origem, mas, aqui, para expor uma das suas grandes virtudes, segundo os signatários).

Esse pedido, que encontrámos no periódico em causa, ilustra o desejo dos estudantes portuenses serem equiparados com os de Coimbra (e isso sucederá também em Lisboa e resto do país), dentro do movimento que se alastrou a todo o território e que reclamava defesa da identidade (estética, nomeadamente) do estudante português, através do uso obrigatório de um uniforme inequívoco e transversal.


Foi essencialmente a pressão dos alunos do 3º ano da Escola Médico-Cirúrgica do Porto, que dá novo fulgor ao uso capa e batina, a qual já estava em uso pelos escolares do Liceu, nomeadamente.
Com a formação da Tuna Académica do Porto (Estudantina Portuense), em Março de 1888 (com alunos do liceu, da Politécnica e da Médico-Cirúrgica, entre outros), o empurrão do nacionalismo gerado pelo Ultimatum e requentado pelo 31 de Janeiro de 1891, e, finalmente, o debutar de festividades carnavalescas e de fim de ano (Enterro da Farpa, Festa da Pasta), estavam lançados oa alicerces para o sedimentar da capa e batina no seu novo modelo burguês, na cidade do Porto
, de que este artigo acusa essa  ferverosa adesão.

Se é sabido, e comprovado, que o traje estudantil, ao longo dos séculos, nunca teve pretensão de distinguir ricos de pobres, mas tão somente o foro académico (distinguir os estudantes do resto da população - de que os regulamentos vários ligados ao foro académico e ao uso da indumentária atestam), não deixa de ser preciosa esta menção, entre os vários argumentos apresentados para suportar o pedido (aliás, se virmos bem, qualquer predicado serve quando queremos justificar algo), porque nos situa cronologicamente no ponto a partir do qual o mero argumento irá, mais tarde, tornar-se, erroneamente, explicação.

Torna-se, assim, este artigo, um documento ímpar que refere, embora apenas como argumento (ou seja, como consequência), que uma das virtudes do traje era o de nivelar e igualizar os estudantes, quanto ao seu estatuto social.

Os argumentos que constam do manifesto, então dirigido ao Rei, D. Luís I,  (e pedindo diferimento através da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino) foram os seguintes:

  1. Economia aliada à máxima decência no vestuário;
  2. Evitar distinção e rivalidades de aparências de fortuna em uma classe onde somente devem fomentar o desenvolver-se de distinções e rivalidades de talento, aplicação e bons costmes;
  3. Provocar maior união, não só do estudante portuense, mas do estudante português (...);
  4. Facultar aos menos favorecidos de meios pecuniários, mas foverecidos de talento e de vontade, mais fácil ingresso nos templos da ciência com manifesta utilidade do estado sem prejuízo algum das suas finanças.

Como podemos ver, enaltecem-se as virtudes do traje, sendo que o artigo nos dá a entender que o pano em questão (o modelo burguês de que deriva a actual capa e batina) estaria mais ao alcance da bolsa dos estudantes do que o anterior uniforme talar (e mais em consonância com o ideário político em voga) . Qual o preço praticado, isso, não sabemos, para afiançar com toda a segurança.

Parece-nos, igualmente, que o argumento da igualização entre estudantes (em clara oposição às anteriores vestes que nunca foram totalmente uniformes entre escolares) poderá, quiçá, advir desse mesmo sentimento ou ideário republicano (e inspirado na França revolucionária da "Liberté, Égalité et Fraternité", que é a pátria da "Déclaration Universelle des Droits de l'Homme", de 1789) de tornar todos iguais (algo que, como sabemos, será sempre utópico).

Estamos, assim, em crer que este documento nos vem indiciar a origem dessa explicação truncada sobre a origem do traje que, durante anos, foi, erradamente, doutrinada nas praxes, onde se dizia que o traje tinha sido criado com esse propósito.
Convém relembrar que, mesmo depois de se generalizar, o modelo burguês, a "actual" capa e batina, não deixou de possibilitar a exibição de diferenças, bastando (re)lembrar, a título de exemplo, que os coletes, durante as primeiras décadas do séc. XX, se apresentavam de várias cores e feitios, tal como as gravatas).

Sabemos, agora, um pouco mais.


O Comércio do Porto, de 29 Fevereiro de 1888, página 1.