quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Notas Burlescas (Defecaram na Praxe, a culpa é da D. Júlia)

Uma estória, em jeito de parábola, e no seguimento do artigo anterior, dedicado à defesa (séria) da Praxe.
Um texto que retoma a idieia vicentina de "Ridendo Castigat Mores".

Para bom entendedor.......





No Bairro da Tradição, encontra-se o edifício da Praxe, com várias dezenas de condóminos e suas famílias.
Dois elevadores servem o prédio e tudo parece correr naturalmente, naquele pacato bairro.
O problema é que nas escadas do prédio têm aparecido coisas bizarras e mal cheirosas.
Com efeito, parece que alguns condóminos mais aflitos ou "sonâmbulos" têm feito do vão (e degraus) das escadas o seu sanitário, mas como são raramente usadas, a coisa tem passado algo despercebida (ou pelo menos tem sido ignorada, pois obrigaria a incómodos, desde logo limpar ou denunciar os vizinhos - quando todos querem "boa vizinhança").
 
No outro dia, a D. Júlia, que é a funcionária do CTT que distribui o correio, teve de entrar para entregar uma encomenda no 10º andar. Como é claustrofóbica, utilizou a escadas para cumprir a sua tarefa.
 
Qual não foi o seu espanto, quando, ali-acolá, num ou noutro ponto mais escuro, descobriu aquelas “alheiras”. Tinha-lhe cheirado a algo “esquisito”, mal abrira a porta de acesso à escadaria, mas nunca imaginara que ali faria tais descobertas.
 
D. Júlia, há que o dizer, é uma grande quadrilheira e faz do mexerico a sua segunda especialidade, logo a seguir à confecção de tartes de maçã.
Claro está que, em poucos dias, toda a vizinhança sabia do caso, tornando-se alvo de chacota até nas reuniões da paróquia, do clube de caça e pesca ou no supermercado. E não se fizeram esperar as piadinhas do costume aos moradores do edifício.
 
Tal alvoroço pôs em pé de guerra o prédio em causa e foi marcada assembleia geral de condóminos.
 
Olhando para a acta lavrada dessa reunião foi possível perceber que:
 
Muitos condóminos pretendiam processar a D. Júlia por difamação.
Outros, por sua vez, diziam que as poias eram rareadas, só num ou noutro sítio, e que, comparando com a larga maioria dos degraus e patamares limpos, não havia razão para alarme.
Um ou outro, mais afoito, reclamava que, como quase todos usavam elevador, isso não prejudicava ninguém e que o problema era tão só dos condóminos que não cumpriam a tarefa de limpar também as escadas (ficando-se apenas pela porta de entrada, elevadores e patamares dos elevadores).
Muitos também diziam que nunca lhes tinha cheirado mal a eles, pelo que não percebiam que cheirasse mal aos de fora.
 
A culpada de tudo isso, pelos vistos, era da D. Júlia ou de quem quer que fosse de visita ao prédio e usasse as escadas.
 
Defecaram nas escadas do prédio da Praxe, mas, e segundo a acta da reunião, apenas 2 ou 3 condóminos discordaram, mostrando-se, isso sim, indignados por haver moradores a cagar nas escadas.
Só esses 2 ou 3 é que não percebiam como podia, a  tantos, não lhes fazer diferença aquele cenário (e a imagem que isso dava do prédio e moradores), e como já nem o cheiro era incomodativo (um odor apenas disfarçado, enquanto as portas de acesso às escadas se mantivessem fechadas).
Só esses 2 ou 3 moradores pretendiam descobrir quem “obrava” no seu prédio, porque as escadas, afinal, eram parte dele.
 
Foram vozes logo abafadas pelos demais condóminos.
Aquilo era um caso isolado; não eram assim tantos “coisos” e o cheiro, esse, tratava-se com um desodorizante ambi-pur adequado. Não era hora de divisões, mas de se unirem contra quem falava mal do prédio.
 
Importava era tratar da D. Júlia, conhecida língua de víbora que estava a exagerar, que preferia ver as 5 ou 6 poias sem olhar aos milhares de degraus limpos.
E tudo porque, em tempos, a D. Júlia tinha contado numa reunião da tupperware que, no prédio, as pessoas acumulavam os sacos lixo à porta de casa, para só ao fim de 2 ou 3 sacos o irem colocar nos caixotes defronte ao prédio. Ela, afinal, é que perseguia o prédio que já tinha má fama por causa dela.
A D. Júlia é que era a culpada de tudo e da má imagem do prédio, mesmo se era verdade que várias pessoas no bairro já sabiam (e comentava à boca pequena) da falta de higiene que por lá se registava.
 
Estranhamente, dessa acta, nada sobre limpar “aquilo”, nem mesmo contratando uma empresa de limpeza.
Já “limpar o sebo” à cusca da D. Júlia, isso, sim, era imperativo e foi votada a marcação de uma reunião extraordinária e uma comissão para a liderar e apresentar medidas.

 
EPÍLOGO

Têm chegado várias queixas (a maioria anónimas) à delegação dos CTT a acusar a D. Júlia de distribuir mal o correio, de se atrasar ou de ir ao café beber a bica em hora de expediente.

Na sede da associação cultural, durante os jogos de bridge ou nos ateliers de lavores, diz-se em surdina que D. Júlia bebe e tem um amante.

Nas paredes defronte à igreja, alguém escreveu que a D. Júlia era uma vaca.

Chegou a haver uma vigília, com vela e tudo, à porta do prédio, por parte dos condóminos e famílias. Foi tudo filmado pelo filho da D. Deolinda, que trabalha na loja de informática, que o colocou de imediato no FB e youtube.


No pacato prédio da nossa história, pouco ou nada mudou.
Bem, na verdade, chegou ontem uma remessa de 10 caixotes de ambientadores Air Quick e vários estão a ser colocados nas escadas.
Junto aos extintores existe também um dispensador automático de máscaras para, em  "casos de incêndio", proteger da inalação de "fumos".

Sabe-se, pelo Sr. Gervásio (que substitui nos CTT a D. Júlia, agora de baixa), que 2 ou 3  condóminos limparam os patamares das escadas do seu andar e os degraus imediatamente circundantes, mas a larga maioria não.

Na porta do rés-do-chão, que dá acesso às escadas, foi colocado um letreiro com o aviso de que as escadas estavam fora de serviço e que os elevadores eram óptimos, mais práticos e modernos, usando, até, sistema anti-poeiras e anti-ácaros, para evitar alergias.
Nos elevadores existe um dispensador de toalhetes perfumados (bónus pela compra da remessa de ambientadores).
 


 

 

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