quinta-feira, 24 de abril de 2008

Notas sobre a Praxis Olissiponense (II).

Realizada que foi a Benção das Fitas na cidade universitária, em Lisboa, oferece-me lançar alguns considerandos que irão ao encontro do já dito, em anteriores artigos, sobre praxe, pasta, fitas, entre outros.

Não é a primeira vez que urdo um reparo à praxis lisboeta (daí esta 2ª Nota) e ao modo como ela é entendida e vivida, até porque, como os leitores mais atentos se recordarão, por mais que uma vez afirmei, não se poder falar propriamente de praxe, de verdadeira praxe, nesta academia, mas, desta feita, julgo que importa que os leitores alfacinhas, ainda ligados a esta vertente do exercício da cidadania académica, possam sair da sua letargia e imprimir um outro caminho, sob pena de “abandalhar”, definitivamente, o actual circo em que se tornou a praxe por estas bandas.

Este fim de semana que passou, as televisões, como é costume, deram alguma atenção à celebração da Missa dos Finalistas, com alguns canais a entrevistarem alunos em conclusão de curso. Nada de anormal, pelo contrário, neste particular (pena é não o fazerem noutras ciades). Anormal, isso sim, é o que se continua a ver e ouvir.

Saberão os académicos, os estudantes do ensino superior em que consiste a Pasta da Praxe? Não sabem, isso é um facto, bastando ter visto os simulacros de pastas abanadas com uma parafernália de fitas que mais parecia um carnaval carioca.
Saberão, estes mesmo estudantes, que as fitas a usar são em número de 8 apenas, e que existe uma ordem de colocação e atribuição das mesmas para assinar?
Não sabem, é facto, não apenas pelo que na TV se ouve (a roçar o ridículo ou o cómico por tanta ignorância junta) ou pelo que eu próprio constatei por antigos alunos meus.

Já nem vou falar, sequer, no trajar com malas e malotes de senhora, porque me dá voltas ao estômago.
O que prendeu a minha atenção foi ouvir uma finalista a explicar ao jornalista a simbologia do seu traje, símbolos, pins e afins.
Hilário e tantos outros académicos devem ter dado muitas voltas “em número ímpar”, onde quer que estejam!

Com que então, o grelo, pregado na lapela esquerda com in pin (!?!), é composto por duas fitinhas de seda?
Com que então usa-se grelo e fitas ao mesmo tempo em missa de finalistas?
Com que então a colher de café, posta na gravata é símbolo académico?
Com que então, o traje serve de uniforme militar, onde nem as golas se véem de tanta “medalha” (vulgo pins) ganha, e que se usam, principalmente, em cerimónias oficiais?
Com que então pasta comprada “na stapples” (ou equiparado), brasonada por fora com logotipo, é Pasta da Praxe?
Com que então usa-se pasta e fitas sem traje?
Com que então ela, a Pasta, só serve para transportar milhentas fitas (na moda de que é uma por cada subscritor)?

Tenham lá paciência, mas pergunto quem andou a formar, ensinar e orientar estas pessoas na praxe, porque, esses sim, são os verdadeiros culpados e hereges, num acto de vandalismo à tradição e cultura académicas sem precedente.

Não posso, em consciência, colocar o todo o ônus da culpa apenas nos finalistas e outros, porque muitos não têm culpa de quem inventou ou deixou que se inventasse tanto. Tenho pena, apenas, que a classe estudantil seja tão pouco esclarecida e desconhecedora das práticas e regras, da sua história e significado, para a viverem de forma mais consciente e crítica.
Onde estão os responsáveis, os veteranos, conselhos de praxe Dux e afins?
Que formação, idoneidade e competência têm para assumir essas funções?
Se não são solução, são parte, ou a grande parte, do problema e, por isso, como dizia uma colega minha, “quem não tem competência, não se estabelece”!
Se a cidade é incapaz de se colocar sob os auspícios de um organismo inter-academico, em termos de coordenação da praxe, pelo menos que cada instituição prime pela excelência em termos de praxis, de modo a evitar-se aquele ajuntamento que mais não é do que uma passerelle vergonhosa daquilo que ainda têm a distinta lata de chamar de praxe.

Desculpem o tom mais azedo, mas nestas coisas, entenda-se, de uma vez por todas, que não há meias medidas: ou é ou não é.
Diz o chavão que “Dura Praxis sed Praxis”, máxima que muitos, tolhidos intelectualmente, apenas ligam ao ritual de acolhimento dos caloiros, quando o significado se prende muito mais com a forma de se ser e estar, pois a praxe não é dura (como já o foi em tempos remotos), mas é firme, séria, primando pelo rigor. Esse é o sentido de Dura Praxis, reforçada pela adversativa “Sed Praxis” - nesse tal sentido de que não tem outra forma de o ser (porque, quando não, passa a outra coisa qualquer).

Não quero, com este artigo, deitar qualquer bréu sobre a festividade da Missa dos Finalistas – longe mim!
O facto de finalizar um curso, o estatuto de finalistas é motivo de gaúdio, júbilo, de festa rija e, numa época tão competitiva, de conjunctura económica e social tão apertada, temos mais é que dar os parabéns a toda esta gente, mesmo se paira no ar a incerteza de um futuro tão risonho quantodesejado, para a maioria deles, no mercado e trabalho.

Mas se, naturalmente, nos associamos à alegria daqueles que obtêm, após tanto esforço, o merecido canudo, tal não nos deve coibir de apontar o dedo e repudiar tudo quanto é perpetrado em nome da praxe e da tradição. ou desculpado só porque é festa!

Se certos senhores que se dizem “praxistas” (expressão que erradamente é tida como o acto de praxar) tivessem, isso sim, a lucidez de pensar em informar-se e formar-se, para depois informar e formar os outros (em vez de andarem a perseguir caloiros e em festiolas etílicas – resumindo nisso a sua acção), quem sabe as coisas não tivessem chegado a esse ponto.
É que certos indivíduos ainda não passaram da pré-primária da praxis, por isso só ainda sabem pintar e fazer desenhos nos caloiros ou brincar ao “faz de conta”.

A Praxe Académica, sua cultura e tradição, não é assunto de enclaves, mas diz respeito a todos, porque a praxe é um património nosso. E não falo, obviamente, dos pequenos aspectos que vão diferindo de instituição para instituição, sem se perder o essencial.
Neste caso, sobre capa e batina, pasta da praxe, grelo, fitas………. não há cá lugar a modas ou invenções, não há cá lugar a “praxe à moda de Lisboa” (ou qualquer outra localidade)!

Fica o reparo e o alerta, que espero possam servir de repto às forças vivas e sérias da academia lisboeta (muitos também ligados ao mester tunante), no intuito dela poder encetar uma mudança profícua que a dignifique, enquanto tal.

Os ditos líderes da praxe, responsáveis pela aplicação e respeito dos usos e costumes universitários, se não sabem, não podem ou não querem, que se demitam e possam dar lugar a quem assuma essa função com elevação, excelência, conhecimento e saber sobre praxe, para que lhe restituam todo o seu brilho e carisma, toda a sua significância (e possa assim ser vivida por todos).


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